[TEXTO] Rui Miguel Abreu [FOTO] Direitos Reservados
É verdade que anda tudo ligado: o olhar permanente sobre o passado inaugurado pelo hip hop; a redescoberta para o presente de pedaços de história relevantes para qualquer sampler que se preze; o regresso dos sintetizadores; a glorificação de gente como Goblin ou John Carpenter; a explosão das etiquetas especializadas em bandas sonoras de cinema de terror; Stranger Things… Tudo ligado de facto.
E agora desembocámos num presente em que é normal existirem bandas a reclamar a influência de todo esse legado (Zombi, S U R V I V E…) e editoras apostadas em relançar tudo o que em tempos esteve confinado à baixa fidelidade de cassetes de VHS de origem duvidosa (Finders Keepers e Death Waltz à cabeça, mas também Mondo, Invada, One Way Static…). E isto para não falar da recente e aparentemente imparável explosão na área das reedições de material de library e bandas sonoras giallo italianas… E ainda bem que tal acontece porque a quantidade de música absolutamente maravilhosa enterrada sob pedaços de carne, zombis mal-encarados, maníacos armados com moto-serras, vampiros com muito ou pouco charme, assassinos em série com ou sem máscara, monstros, casas assombradas, etc, é, sem dúvida, espantosa.
Temos oito sugestões que podem muito bem assombrar ainda mais o vosso Halloween.
John Carpenter & Alan Howarth
Halloween III – Season of the Witch
1982
Este é, claramente, um dos casos em que a banda sonora ultrapassa o filme. Para a terceira dose da franchise, Carpenter voltou a colaborar com Alan Howarth numa banda sonora exclusivamente electrónica, noturna, densa e pesada: arpégios sintetizados, ritmos incessantes que parecem traduzir a inevitabilidade da tragédia. Mesmo sem grandes conhecimentos musicais, Carpenter tem o mérito de ter dado uma identidade sonora ao medo e em Halloween III a sua fórmula já estava plenamente refinada, oferecendo a incontáveis músicos contemporâneos equipados com sintetizadores – de Steve Moore a Antoni Maiovvi – um inescapável molde criativo.
Goblin
Suspiria
1977
Os italianos Goblin de Claudio Simonetti trabalharam abundantemente com Dario Argento e serão, juntamente com Carpenter, os outros expoentes de todo este género. Ao minimalismo do americano, os Goblin contrapõem uma visão mais expansiva – eram, afinal, uma banda de perfil prog – que inclui uma paleta sonora mais rica, mas onde a electrónica ainda é dominante. A voz no tema título de Suspiria é, claro, arrepiante.
https://www.youtube.com/watch?v=QkZ2rdbDHM4
David Lynch & Alan R Splet
Eraserhead
1977
David Lynch é outro realizador que gosta de estender as suas visões – que podem ser perturbadoras, como se sabe – ao campo musical. Neste clássico de 1977, Lynch, com a ajuda do sound designer Alan R Splet, conduziu uma série de experiências sonoras, gravando máquinas e ruídos incidentais para construir uma peça musical devedora da música concreta e que provou ser uma influência decisiva para músicas da área industrial.
https://www.youtube.com/watch?v=LgtisIQtcqg
Bernard Herrmann
Psycho
1960
Herrmann é um mestre e praticamente sozinho construiu um código musical para o suspense, sobretudo através do seu trabalho com cordas que neste clássico de Hitchcock atinge o seu auge: violinos staccato, “stabs” de orquestra com pleno efeito dramático, melodias carregadas de melancolia. Estes temas são depois trabalhados em variações múltiplas, pensadas para se adaptarem a passagens específicas do filme. Brilhante.
Ennio Morricone
The Thing
1982
Morricone é um dos maiores compositores do século XX, certamente com direito a constar no Top 5 dos criadores de música para cinema. Com esta banda sonora, Morricone, que domina várias linguagens musicais – das grandes molduras orquestrais à música experimental, jazz e easy listening -, trabalhou com uma paleta electrónica que é uma vénia ao realizador de The Thing, John Carpenter, assinando um score denso, negro e gótico.
https://www.youtube.com/watch?v=EnFc7D0ZoCc
Ralph Jones
Slumber Party Massacre
1982
Mais um discípulo de Carpenter, com uma banda sonora brilhante, electrónica e perfeitamente arrepiante. A trabalhar com meios muito económicos (usando um único sintetizador Casio) e muita imaginação, Ralph Jones, irmão da realizadora do filme, Amy Jones, assinou aqui um perfeito equivalente sonoro da proposta cinemática de Slumber Party Massacre: um “slasher” de culto que mantém as pessoas na borda das cadeiras.
Fred Myrow & Malcolm Seagrave
Phantasm
1983
Ralph Jones pode ter copiado Carpenter, mas Fred Myrow e Malcolm Seagrave definitivamente apontaram os ouvidos aos Goblin e a Suspiria neste score realizado para Phantasm. Trabalhar próximo de modelos alheios sublinha o carácter do género, mas também estimula a criatividade por obrigar a funcionar com margens tão definidas. E o score electrónico de Phantasm é brilhante, com melodias que se colam às imagens como se tivessem lá estado desde sempre.
Howard Shore
Videodrome
1983
Howard Shore é um nome grande de Hollywood e o seu trabalho neste clássico de David Cronemberg é absolutamente incrível. Tal como os métodos usados para a sua criação: a partitura escrita com ambição orquestral foi executada primeiro no Synclavier, um sintetizador digital pioneiro, e depois o resultado foi regravado por um ensemble de cordas. O que se ouve é o cruzamento das duas realidades. Tal como no filme existem dois planos.