7 Dias, 7 Vídeos

Era digital, informação à velocidade da luz. Vídeos e músicas a soçobrar pelas plataformas virtuais. Novidades emaranhadas entre si, confusão sónica, sentidos desorientados. Quem nos guia? Por onde vamos? Para onde vamos?

7 Dias, 7 Vídeos é o resgate audiovisual semanal nos terrenos do hip hop e electrónica. Filtragem de qualidade, barreira contra a poeira que nos cega com tanto de novo, com tanto para espreitar e escutar.

[xtinto] “Berço” (prod. Kidonov)

É muito fácil fechar os olhos ao que está mal quando se chega a um certo lugar de privilégio para não ficar mal visto perante a máquina da indústria. xtinto até já leva uns quantos palcos das grandes cidades no currículo, mas não conseguiu ficar calado face às portas que tem encontrado fechadas na própria zona que o viu crescer. E não foi o facto de já contar com um Teatro Municipal de Ourém esgotadíssimo para o ver que deixou de lançar este abre-olhos em forma de single que é “Berço”, que foi dissecado na primeira pessoa do plural — com o produtor Kidonov a dar também o seu parecer — por estas páginas na passada sexta-feira. São atitudes de valentia como esta que merecem todos os nossos aplausos e, acima de tudo, figas, na esperança que as autarquias apanhem esta mensagem e comecem a dar mais valor ao que está a ser feito ao seu redor, ao invés de apenas navegarem a onda quando esta já tomou proporções a uma escala nacional. xtinto vai finalmente jogar em casa e só podemos desejar que consiga sair de lá com uma valente goleada.

[Joyner Lucas] “Sticks & Stones” feat. Conway The Machine

Já dizia o ditado: Sticks and stones may break my bones, but good raps will always amuse me. Talvez nem seja bem assim, mas é o que faz sentido ao escutar este cruzamento entre dois pesos-pesados do game, Joyner Lucas e Conway The Machine, que aqui nos fazem vibrar até ao tutano com pancada verbal da boa. Assente num instrumental de recorte clássico fruto de um esforço conjunto entre ADHD Productions, Leo Son, Boi Yanel e Mario Luciano, “Sticks & Stones” é mais um aperitivo relativo a Not Now I’m Busy, álbum que Lucas irá lançar já a 22 de Março.

[Matt Champion] “Slug”

Já alguma vez quiseram que a vossa cara-metade fosse uma lesma colada ao vosso corpo? Não há amor que não seja peganhento quando é a sério e é por isso que Matt Champion quer sentir um pouco dessa gosma no seu mais recente tema, “Slug”, que chega até nós um par de semanas após “Aphid”, aquela que foi a sua primeira amostra a solo desde que, em 2017, exibiu as “Fangs”. O cantor/rapper deixa claro que o seu talento vai continua a gerar música nova no pós-BROCKHAMPTON, colectivo do qual fez parte, e dada a insistência no lançamento de singles no mês passado pode muito bem estar a preparar aquele que será o seu disco de estreia em nome próprio. Até agora, a coisa está a soar bem…

[4Batz] “act iii: on god? (she like)”

Se ainda não se depararam com 4Batz, o melhor mesmo é medirem a pulsação. A nova sensação hiphopeana do TikTok já está a causar tremores de terra mesmo fora da aplicação chinesa, e até aqueles que não a têm sequer instalada, como é o caso de quem aqui vos escreve, vão celebrando cada lançamento que este jovem de Dallas tem vindo a protagonizar. A fusão entre rap e R&B para corações moles de 4Batz está a conquistar ouvintes pelo mundo inteiro e vem dividida por actos, como pequenas histórias de encontros e desencontros amorosos. Depois de “act i: stickerz ’99’” e “act ii: date @ 8” no ano passado, o promissor artista norte-americano tira-nos a barriga de misérias em 2024 com este “act iii: on god? (she like)”.

[Ho99o9] “A MACHINE OF”

A arte de bem casar o hip hop com o lado mais pesado da esfera rock/metal tem estado bastante bem representada ao longo da última década desde o aparecimento dos Ho99o9. O grupo liderado por theOGM e Yeti Bones não nos tem faltado com combustível para atear esse fogo e, em 2023, criaram até uma colectânea recheada de interessantes convidados, como JPEGMAFIA, Armand Hammer, RiTchie, Duckwrth ou Lojii. Agora que a poeira em torno de Ho99o9 Presents Territory: Turf Talk, Vol. II assentou, o grupo volta a fazer das suas em mais uma descarga de bombos, tarolas e feedbacks neste seu mais recente “A MACHINE OF”.

[Joey Valence & Brae] “JOHN CENA”

Se os Beastie Boys tivessem surgido “ontem”, provavelmente seriam apenas uma dupla e responderiam pelo nome de Joey Valence & Brae. Estes dois jovens do estado norte-americano da Pensilvânia apareceram em cena em 2021 e, no ano seguinte, causaram um enorme alvoroço graças ao seu potente single “Punk Tactics”, que deu depois origem a um LP com o mesmo título em 2023. A sonoridade tem algo de nostálgica, com alguns condimentos de uma electrónica mais actual, mas o tom humorístico está bastante mais actualizado e não se cola a uma mera réplica do afamado trio nova-iorquino que ousou mesclar o hip hop com a atitude do punk. O segundo álbum de Joey Valence & Brae está previsto chegar lá mais para a frente ainda este ano e tem neste “JOHN CENA” o seu mais recente avanço.

[Fred again.., Lil Yachty & Overmono] “stayinit”

Vamos ser claros. Só existem duas formas válidas de fazer vídeos de reacts: quando há realmente algo a dizer que possa acrescentar à obra que está a ser analisada, ou quando a reacção, mesmo que sem grandes argumentos, é genuina, inesperada e espontânea — como meter um pai ou um avô a ouvir/ver algo que, à partida, lhe seja muito estranho. O vídeo de “stayinit” não parece encaixar em nenhuma dessas opções, mas dado que é uma peça que tem o aval de todos os artistas envolvidos, então está tudo bem. Conta-nos a história na descrição que esta realização de UNCANNY captou a reacção natural de Lil Yachty naquela que foi a primeira vez que escutou “stayinit”, a sua colaboração com Fred again.. e Overmono, num bom sistema de som. Parece-nos tudo demasiado coordenado para que não exista ali uma certa teatralidade, mas não deixamos de desejar ter tido a oportunidade de estar naquele mesmo espaço a dançar no meio de uma lotação mais do que esgotada. Está assim encontrada a primeira pegada na discografia de Fred again.. em 2024, lançada um mês após o produtor inglês ter arrecadado os seus primeiros dois GRAMMYs.