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Fotografia: Tiago Pinheira
Publicado a: 10/01/2022

Mãos omnipresentes e ritmos omniscientes.

Iúri Oliveira: “O ‘Habitat’ fala da ideia de que a solidão não tem de ser uma coisa triste. É um sítio de que não podemos ter medo”

Fotografia: Tiago Pinheira
Publicado a: 10/01/2022

“A gente gosta de ti, mas a porta vai-se fechar”. Foi com esta deixa que o músico e percussionista Iúri Oliveira se despediu da empresa em que trabalhava, em abril de 2015, para agarrar uma oportunidade irrecusável: fazer o concerto de Sara Tavares, em frente à Assembleia da República, a 24 de abril desse ano. Passaram quase sete anos desde esse momento, e o músico é hoje uma figura omnipresente da cena musical portuguesa. A lista de artistas com quem gravou ou com quem tocou ao vivo é imensa, incluindo nomes como Sara Tavares, Lura, Criatura, Agir, Branko, Selma Uamusse, Madona, Julinho KSD, Ana Moura, EU.CLIDES, Aline Frazão, D.A.M.A, Rui Veloso, Paulo Carvalho, Ana Laíns, Firmino Pascoal, Rita Vian e muitos outros. Mas se hoje lhe reconhecemos uma identidade consolidada e uma presença regular em álbuns e nos palcos, o percurso que o trouxe até aqui não foi isento de dificuldades e desafios.  

Filho de pai angolano e de mãe portuguesa, o impulso pelos ritmos e pelos instrumentos de percussão começou bem cedo, de forma autodidata, quando tinha doze anos de idade. Vivia nas Caldas da Rainha e, quando fez 18 anos, atirou-se para Londres para estudar percussões latinas. Acordava às quatro da manhã para limpar escritórios, tinha aulas à tarde e à noite era taxista. A vida era dura, mas havia uma paixão maior que o alimentava e que haveria dar frutos alguns anos mais tarde. Passou ainda pela Holanda, onde estudou conceitos e adaptações ao Jazz e World Music, mas foi em Lisboa que tudo mudou, nesse 24 de abril de 2015, um dia que nunca esquecerá. 

Teve de se despedir para agarrar a oportunidade desse dia, uma decisão difícil, mas que haveria de lhe mudar a vida, já que mal acabou o concerto de Sara Tavares, enquanto arrumava os instrumentos, a manager da Lura o convidou para fazer uma tour com a cantora na África do Sul. A partir daí a sua viagem nunca mais parou. Só no ano de 2021 tem créditos em 14 álbuns, correu o país com dezenas de projetos, e pelo caminho ainda acompanhou a tour internacional de Madona, experiência que o fez valorizar ainda mais a riqueza da música portuguesa, a sua diversidade e os seus profissionais.

Neste dia do seu aniversário decidiu partilhar “Habitat”, um tema original que compôs a solo, e para o qual convidou Manuel Rocha. Uma música que, como aqui nos revela, foi a forma que encontrou para conseguir coabitar a melancolia, para abraçar “uma ideia de solidão que não tem de ser uma coisa triste ou destrutiva”. Para além da música, lança também o seu novo website, onde podemos conhecer ao seu percurso, a sua discografia, concertos e aceder muitos mais materiais. De tudo isto nos falou este músico camaleónico e apaixonado, que se continua a sentir uma criança de olhos a brilhar quando vê os outros a tocar. Ao contrário de outros entrevistados, que sabemos que não vamos encontrar tão cedo, com Iúri Oliveira só nos podemos despedir com um “até já”, já que são muito elevadas as probabilidades de escutarmos as suas percussões no próximo álbum que ouvirmos ou nos próximos concertos a que assistamos. 

Nota: a faixa “Habitat” encontra-se no site do músico e irá estar brevemente em todas as plataformas digitais.



Tu és uma figura omnipresente na cena musical portuguesa, com centenas de colaborações em álbuns e ao vivo. Como é que começou a tua relação com a música? Quando é que começaste a tocar, com quem e onde? Fala-me um pouco da tua origem como músico e compositor.

Eu como músico comecei muito cedo, aos doze anos de idade, mas era muito aquela coisa autodidata. Sou das Caldas da Rainha, não havia muita coisa, mas sempre fui em busca da cena rítmica, da envolvência com o ritmo, com os instrumentos de percussão. 

E esses ritmos que procuravas vinham dos discos que ouvias em casa? 

Também. O meu pai é de Angola, a minha mãe é portuguesa, eu tinha muita influência da cena cubana, da cena angolana, muita coisa cabo-verdiana, portuguesas também, mas já começava à procura daquilo que eu gostava de ouvir. Fazia música de forma autodidata, mas quando estava no 12º ano tive de pensar num curso universitário. Não sabia o que queria ser, mas sabia que tinha uma paixão que me movia, que era a música. Procurei universidades e cursos, mas confesso que venho de uma família que não podia de todo ajudar e vir para Lisboa só para estudar era impensável. Não tinha essas hipóteses e percebi que tinha de ir trabalhar. Então atirei-me para Londres porque tinha lá um conservatório de percussão latina e foi lá que dei assim um grande upgrade

Onde é que estudaste? 

Foi no The Rhythm Studio – London School of Popular Music. Estudei percussão latina, o meu professor gostou de mim e disse para ir tocar para a banda dele. 

Mas trabalhavas enquanto estudavas? 

Claro. Levantava-me às quatro e meia da manhã para limpar escritórios até às oito e meia. Depois tinha aulas do meio-dia às seis. E à noite era taxista. 

Fogo… Devias andar cansado!

Esquece, foi mesmo complicado. Estive lá um ano e pouco e depois vim para Portugal e comecei a integrar aqui meia dúzia de projetos. Mas era difícil entrar no circuito e percebi que a música tinha de continuar a ser um hobby. Fui estudar deporto, tirei um curso de tripulante de ambulância de INEM, mas nem um mês depois de acabar o curso fui para a Holanda estudar música outra vez, no Drumdrumdrum, conceitos e adaptações ao Jazz e World Music. Depois do curso, voltei novamente para Portugal, para as Caldas da Rainha. 

Mas nas Caldas já tocavas em alguns projetos? 

A zona Leiria é muito rock e pop. Eu estava lá num ou noutro projeto, mas eles não compreendiam a minha linguagem. Eu adaptava-me, mas não tinha espaço, nem criatividade. Decidi atirar-me para Lisboa e vim trabalhar numa empresa de atividades outdoor, fazendo música como hobby. Houve um dia, em que tinha férias marcadas e o patrão chegou e disse que já não me podia dar as férias todas, só podia tirar oito dias. Eu tinha programado viajar, mas tive de mudar tudo, porque ou era despedido ou faltava e não recebia. Estava bué chateado e decidi ir fazer sozinho os caminhos de Santiago. E quando estava a voltar, no comboio de Vigo para Campanhã, ligou-me a manager da Sara Tavares, a Ani Fonseca, a perguntar se podia fazer um concerto da Sara Tavares no dia 24 de abril de 2015, para substituir o percussionista. E eu: “Ya, claro que posso!!!”

Sentiste o peso da responsabilidade? [risos]

Logo [risos]. Aceitei imediatamente e a combinação era ensaiar de 20 a 23 de abril, das 11h às 18h. O problema é que eu tinha de trabalhar e quando cheguei à empresa disse que precisava mesmo de férias naqueles dias porque era uma oportunidade que não podia recusar. Eles disseram que era impossível e que eu tinha de tomar uma decisão. Eu estava a contrato, era dos poucos, e eles disseram logo: “A gente gosta de ti, mas a porta vai-se fechar”. E eu respondi que nesse caso me despedia. Atirei-me de cabeça, era uma oportunidade. Mas ficas sempre naquela dúvida: vou fazer uma substituição, mas o que é que faço a seguir? Era um concerto na Assembleia da República, nas comemorações do 25 de Abril, com a Sara Tavares, Karyna Gomes, Luiz Caracol, Projeto Kaya, Selma Uamusse e o Tonecas Prazeres. Fiz o concerto e lembro-me perfeitamente de estar a desmontar o meu estaminé todo quando veio a manager da Lura tocar-me nas costas: “Olá, Iúri, olha, a Lura gostou bué do teu trabalho, no próximo mês podes vir para a África do Sul para fazer uma tour com ela?”

Incrível [Risos]. Ela estava lá nesse concerto?

Estava sim. E eu respondi logo: “Posso, claro!”, mas ainda nem tinha passaporte [risos]. Dois dias depois ligou-me a Selma [Uamusse] para ir subsistir um músico, depois ligou-me a Ana Laíns… O 24 de abril de 2015 foi a minha viragem para a música profissional. Graças a essa oportunidade que tive. A partir daí nunca mais parei. 

Já trabalhaste com a Sara Tavares, Lura, Criatura, Agir, Branko, Selma Uamusse, Madonna, Julinho KSD, Ana Moura, Aline Frazão, D.A.M.A, Rui Veloso, Paulo Carvalho, Ana Laíns e muitos outros. Tudo linguagens muito diferentes também. Como é que te adaptas a todos esses territórios sonoros?

É uma bela questão. Eu costumo dizer que todo eu tenho muito África dentro de mim, até por causa dos meus genes, dos meus pais. Mas tenho também uma grande paixão pela América Latina, tenho uma amante que é a música ibérica, tudo o que mistura Espanha e Portugal, adoro ritmos brasileiros… Eu procuro aquilo que eu gosto e tento adaptar-me. As duas experiências em Londres e na Holanda foram uma grande base ao nível da abertura e de me poder adaptar aos vários estilos, conseguir servir o que cada artista procura. Às vezes é complicado porque há um grande preconceito a nível da percussão, que é aquela imagem daquele mano que toca djambés no Sudoeste… Isso acontece constantemente. 

Ou aquela ideia de que um percussionista ou um baterista no fundo é a mesma coisa…

Isso. É o tipo que não conseguiu estudar bateria. Nada disso. Às vezes é difícil explicar o mundo a que conseguimos chegar como percussionistas. A Sara Tavares costumava explicar que é conseguir ser um silêncio no meio da cidade e ser uma selva inteira no meio de uma planície. É preciso trabalhar esses pormenores todos. Eu acredito que é importante passares de bandas para bandas, errares, corrigires, ouvires muito os inputs dos outros músicos, ir à procura das referências certas. Eu levo tudo isso numa bagagem. 

E achas que um percussionista tem de se colocar ao serviço do músico para quem toca ou tem também uma identidade própria e deve transportar uma certa influência sua? Percebo a ideia de que estavas a falar sobre saber servir cada músico, mas ao mesmo tempo és tu que ali estás, e não outro qualquer, com a tua história, a tua identidade, as tuas influências.

É verdade. Acho que isso se pode adaptar a qualquer músico. Há trabalhos em que me dizem: “Quero que faças isto que está aqui”. E aí tudo bem, eu vou ser um profissional. Outra coisa é quando te dizem: “Eu quero aqui esta atmosfera”; “quero aqui este tipo de groove”; “quero aqui esta entrada ou esta saída”. Aí tu podes levar a tua impressão digital, o teu ADN. Sempre que posso tento levar um pouco de mim e das minhas influências. E a verdade é que eu faço aquilo que eu sinto e o que eu sinto é diferente todos os dias. Gosto dessa coisa de ser camaleão, de me poder adaptar a todos projetos. Eu quando vou tocar com a Ana Moura, ou agora com a Lura no Coliseu, em que são sets astronómicos, as pessoas ficam muito: “Ah o percussionista é aquele gajo que leva aquela a cena toda…” Eu não levo aquilo por vaidade ou porque quero mostrar que consigo carregar muita coisa. Eu levo aquilo porque sinto que vou precisar de todos os instrumentos e tudo está ali por uma razão. Posso ter um shaker para usar apenas numa das músicas, mas é aquele shaker, e não outro qualquer, que tem de estar ali. Em sets de fado, por exemplo, levo um cajon e uma vassoura e está tudo bem. 

Depois de todos estes trânsitos entre artistas e bandas, palcos e estúdios, decidiste lançar, enquanto compositor, um tema a solo, a que chamaste “Habitat”. O que representa para ti esta música e porquê lançá-la agora?

Eu já tinha composições minhas. Com a Aline Frazão, por exemplo, ou o tema “À Mãe”, do álbum de Criatura [Bem Bonda, 2021]. Só que agora quis fazer uma coisa diferente. Estes dois anos foram duros, não só pela pandemia, mas também a nível pessoal. Em vez de entrar na depressão, pensei: “Vou ter de reunir tudo isto que estou a sentir e fazer alguma coisa, transformar isto em alguma coisa”. Nessa altura estava a gravar o novo álbum do Manuel Rocha [Arco, 2021], que vai sair em breve nas plataformas digitais. Eu já era muito fã do Manuel porque ele tem um álbum com a Maro [MARO e Manel, 2018] que é um álbum lindíssimo. Então, quando compus o tema, convidei logo o Manuel, que aceitou automaticamente. Quando compus o tema, estava num dia mesmo down, down, down e agarrei nisso, nessa mistura de tristeza, ansiedade e angústia. Como sou percussionista, talvez as pessoas pensassem que podia ser coisa mais afro-cubana, mas decidi levar o tema para outro universo, recorrendo apenas à madeira, pele e aço. Nada mais. E depois as vozes do Manuel Rocha, porque é uma daquelas pessoas que me inspiram muito. Estava num mood de tristeza e acho que quando consegues sair dessa rota, dessa melancolia, esses dias são especiais e pode haver muita criatividade a sair desse lugar. 

Quando é que fizeste o tema? 

Foi feito nos finais de 2020, mas como estava a gravar muita coisa, passei o tema ao Manuel, sem urgência em gravar. Eu também não tinha planos. Então, fui gravando, fazendo muitas coisas e agora pensei: “Epá, e se fosse lançar agora?” Este ano de 2021 foi difícil, mas tive mesmo muito trabalho, sobretudo quando tudo começou a abrir. Tive muito trabalho com artistas, bandas e gravações. Em 2021 saíram 14 álbuns onde eu gravei percussões. Então, agora que também ia lançar o meu site, achei que era um bom momento para lançar este tema. 

De certa forma, é um tema bastante existencialista. 

Sim. As pessoas procuram sempre estar bem, ter qualidade de vida, uma vista linda para o mar, estarem em descanso, trabalharem menos. Essa é a forma de estarem bem no seu habitat. Mas às vezes não é bem isso. Para mim, o habitat é também conseguir coabitar dentro da melancolia, aprender a estar sozinho. O tema fala dessa ideia de estar debaixo de água…

Onde tudo fica cada vez mais claro…

Exatamente. Quanto mais fundo eu estiver, mais claro tudo se pode tornar. É aquela coisa: a pessoa está debaixo de água, vai ficar sem ar… Mas há várias coisas que dá para coabitar nesse lugar. Acho que até foi nesse estado que fui buscar forças para me vir à imaginação o tema. Essa coisa de estar debaixo água e esperar pelo vento amigo. É uma das coisas que eu identifiquei muito no Manuel, que é ir buscar os elementos da natureza para estarem a coabitar connosco, agarrei-me também a isso. O “Habitat” fala da ideia de que a solidão não tem de ser uma coisa triste. A tristeza não tem de ser uma coisa destrutiva. É um sítio onde muitas pessoas coabitam, onde nasce muita coisa. É um sítio de que não podemos ter medo.

Sim. Esse vício de estarmos sempre a tentar estratégias de fuga, que às vezes são artificiais, em que há coisas que são adiadas, mas que mais cedo ou mais tarde reaparecem.

Exatamente. É habitar lá, saber estar feliz sozinho também. Poder coabitar aí acho que é muito importante. 

Este tema é experiência isolada ou faz parte de um caminho que queres começar a fazer a solo? 

Eu gosto muito do trabalho que faço com bandas, artistas, de levar a minha bagagem. Acabo sempre por ter muita autoria nas coisas que vão saindo. Para já é um tema isolado, mas já tenho ideias para mais coisas. Não tenho em vista fazer um projeto, mas não é o primeiro nem será o último tema que componho. Eu gosto muito de ser sideman, de ser músico de banda, por exemplo com Criatura, que é realmente a banda que puxa mais por mim.



O concerto que deram no Teatro da Trindade, em maio de 2021, depois do lançamento do álbum, foi um momento super emocionante. 

Foi incrível. Aquele é o concerto onde eu largo o suor todo, largo ali tudo. É um concerto muito duro, em ambos os sentidos: fisicamente puxa mesmo por nós, e depois verbalizas tudo, sai tudo. Gosto muito de ser essa pessoa, que está presente, mesmo não estando à frente. Vou querer fazer mais coisas com mais pessoas que me rodeiam, que me inspiram muito, com aqueles que mais gosto e que mais amo. Quero mantê-los dentro do meu habitat para cocriar mais coisas. 

Para além das tuas colaborações na música portuguesa, tiveste também uma experiência internacional na tour da Madonna. Tens a ambição de trabalhar com artistas internacionais, noutros circuitos? 

Sim, mas quando tu entras nesses circuitos, que são a NASA da indústria da música, percebes que nem sempre a música é o mais importante. O importante ali é mais o espetáculo. Os concertos que demos em Los Angeles, Londres, Nova Iorque, foram altamente para ver como é que a indústria trabalha, mas a verdade é que trabalhar com esses artistas internacionais faz também com que consigas dar ainda mais valor ao que tens cá. Nós realmente, comparados com eles, estamos ao mesmo nível. Só nós é que não nos damos valor. Em Portugal somos pequeninos, mas temos abertura, temos o Norte, o Oeste e o Sul completamente aberto ao Oceano. Tudo entra aqui, somos um país aberto a receber tanta coisa e hoje em dia temos muita influência, de montes de lugares. Só nós é que ainda não vemos isso. 

Mas achas que isso não está a mudar? 

Espero que sim, mas eu vejo no mercado a simples conversa banal: “Ah, eu vou dar este trabalho a um produtor muito bom que vive em Los Angeles”. Porque é que o que está em Los Angeles é que é bom, quando nós temos um António Pinheiro da Silva, um José Fortes, um Rui Guerreiro… Porque não? Pensamos sempre no gajo que trabalhou com a Madonna, que esse é que é bom… Porque é que ele é bom? Eu lembro-me quando estava em Nova Iorque, os tipos ficavam muito à toa quando nos viam a tocar assim, quase a “jammar”. “Como é que vocês conseguem sacar esse som? Isso é o quê? Que estilo de música é esse?”. Para nós era o nosso pequeno-almoço. Nós temos muita influência, e aproveitamos pouco isso. Até os nossos instrumentos… Muitas vezes associam o adufe à cena popular, e a guitarra ao fado, quando esses instrumentos têm tanto poder.  Sinto que ainda não estamos a dar o valor adequado a nós próprios. Com quantos mais artistas internacionais eu gravo ou toco mais valor dou à nossa própria música. Nós realmente não estamos nem atrás nem à frente, estamos no mesmo level, no mesmo sítio, só faltam janelas de oportunidades. 

E sentes que em Portugal, para artistas independentes que nem sempre têm acesso a grandes festivais e rádios nacionais, começa a haver redes que lhes permitem gravar e tocar ao vivo com mais regularidade? 

Vou-te dar o exemplo do Teatro Municipal da Guarda. É uma sala incrível, com ótimas condições, mas se dizes a um artista que vai lançar um álbum, e tem capacidade para encher um Teatro Tivoli ou um Teatro Sá da Bandeira, que vamos lançar o disco na Guarda, o artista não vai querer porque tem de ser em Lisboa ou no Porto. No interior não há mediatismo e nós próprios já estamos formatados que Lisboa e Porto é “onde as coisas acontecem”.  Toda a gente está a pensar sempre assim. Uma pessoa que nasce na Guarda, se quer ser músico profissional, se calhar não há-de ser na Guarda. Houve diretores de teatro que já me disseram: “A tua música não dá para aqui”. Como é que é possível?

Com o lançamento deste teu tema, vais lançar também um novo website e uma nova newsletter. Porque é que decidiste avançar com esses instrumentos de comunicação mais direta? 

Dia 10 de janeiro é o dia dos meus anos e decidi lançar o tema e o site. Perguntei-me sobre se valia a pena fazer um site quando hoje em dia se mete tudo nas redes sociais. Mas estás a ver aquele dia em bloquearam as redes sociais? As pessoas deixaram de ter acesso, porque não controlam essas plataformas. Mas os sites de informação continuaram abertos. Pensei que era bom ter uma plataforma minha, para além das redes sociais. 

É até do ponto de vista de teu arquivo, é mais fácil, para quem quiser conhecer o teu percurso, o teu trilho artístico, ir a um site organizado por ti. O Instagram é muito a promoção do momento, mas não tens um mapa geral do percurso. 

Exato. E o site é para as pessoas poderem ir ler, não é um scroll. A informação está mais profissional, em primeira mão, com o design que eu quero e eu tenho o controlo total. Também decidi fazer isso porque quis também fazer esse statement: “Eu estou aqui”. Não num tom presunçoso, mas para a malta poder conhecer o meu trabalho. Quando eu vou ver um concerto, tenho muita necessidade de saber quem está atrás, gosto de ver os colegas, os amigos. Olho para trás e fico a pensar: “Fogo, está ali aquele amigo que disse que estava sem trabalho e está ali a tocar”.  Eu ainda sou aquela criança que vai ver concertos e que estou com os olhos a brilhar a ver os músicos. É importante dar visibilidade aos músicos, mas também aos videomakers, ao pessoal das luzes, do design de palco, tudo isso faz o espetáculo. 

E o futuro?

Para já estou muito empolgado com novas datas de Criatura, a partir de Abril, e do meu trio de Bossa e Morna, que lançámos o álbum [Encontros] em Novembro também. 

E assim mesmo para acabar, em jeito de brincadeira, gostas mais do palco ou do estúdio? [risos]

[risos] Acho que o palco ganha sempre, mas o trabalho que está atrás, de estúdio, é ali que trabalho e concluo a minha digitação. A paixão é o palco, mas sem dúvida no trabalho de estúdio é onde tu vês todo o processo. O palco é o topo do iceberg, onde acontece tudo o que já tiveste de fazer acontecer na sala de ensaio, que estiveste a gravar e de repente chegou ao palco e até já se transformou. Isto é melhor ainda. 


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