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Publicado a: 01/06/2018

Valas assina disco de “poesia lenta”

Publicado a: 01/06/2018

[TEXTO] Alexandre Ribeiro [FOTOS] Hélder White [CAPTAÇÃO DE VÍDEO] Sebastião Santana [EDIÇÃO DE VÍDEO] Luis Almeida

Este não é o primeiro trabalho de Valas, mas Check-In sabe a um verdadeiro começo. “O disco fala de tentar deixar para trás aquilo que fiz de menos correcto na minha vida, e que pode prejudicar a minha carreira e a minha vida profissional”, revelou-nos o MC aquando da conversa que aconteceu na Fábrica Braço de Prata.

Depois de um ano com cerca de 80 concertos, números do próprio, João Valido fechou o álbum, o primeiro depois de assinar pela Universal Music Portugal. Para chegar a esta fórmula final, o rapper chamou Lhast, Fumaxa, DJ Ride, Agir, SuaveYouKnow, Diogo Piçarra, Slow J, ProfJam, DJ Sims, Fabrice, Cookin’ Soul ou, o nome mais improvável, Raquel Tavares. É uma lista ambiciosa que também serve como prova da mudança de nível: Valas agora joga com os “grandes”.

Nos últimos anos, Sementes de Pedra ou Raízes de Pedra fincaram o nome do MC no panorama nacional. Porém, o novo disco vai beber directamente do projecto Nébula (com Lhast & MadeInLx) e realça as suas valências como escritor de canções. Neste momento, Valas apresenta-se como uma alternativa válida para todos aqueles que procuram rap nas rádios mais focadas na música pop. O “El Dorado” já esteve mais longe…

 



Começando pela faixa que abre o disco: o que é este “El Dorado”? Estamos a falar de um sítio real ou de um estado de espírito?

É uma excelente pergunta e já tinha pensado nessa resposta mais do que uma vez. O “El Dorado” é exactamente esse estado de espírito de felicidade e de concretização. Apesar do nome ser sinónimo de riqueza económica, essa procura pelo “El Dorado”, e esse caminho que eu digo que estamos a fazer, é uma busca por esse estado de espírito de felicidade e de concretização. E de fazer aquilo que acho que é o meu papel na música e no rap. É essa procura pela perfeição.

Existe uma linha de pensamento recorrente nas músicas do disco: a ideia de que estás mais perto de conseguir concretizar os teus sonhos. Concordas que essa seja a principal narrativa do Check-In?

Sim. Eu acho que todas têm mais ou menos o mesmo fio de pensamento e passa por isso. Passa principalmente por uma mudança. O disco fala de tentar deixar para trás aquilo que fiz de menos correcto na minha vida e que pode prejudicar a minha carreira e a minha vida profissional. E tentar dar a volta a isso e seguir a vida de forma mais correcta. E o álbum passa por isso. Passa por querer mudar-me, ser melhor e concretizar os sonhos que outrora tinha pensado.

Quero falar d’ “As Coisas”. Transformou-se num monstro com vida própria, aliás, tive a oportunidade de ver-te ao vivo no Sumol Summer Fest e no MEO Sudoeste e percebi que, a par da “Dragões e Demónios”, era um dos momentos mais esperados. Houve alguma altura em que tiveste medo que esse som se tornasse maior que tu?

Eu acho que sim… a música vai ser sempre um filho meu, não é? Ou seja, fui eu que a fiz e representa muito para mim. E sem dúvida que se tornou muito maior do que aquilo que eu tinha previsto. Por acaso achava que ia ter sucesso quando terminámos a música — até penso que falei nisso contigo –, eu e o Rafa sentimos logo isso, que iríamos ter ali um single forte. Mas depois ganhou, como tu disseste, uma vida própria. Mas não tenho receio nenhum que se torne maior que eu ou que seja reconhecido sempre por essa música porque tenho um orgulho gigante em ter conseguido fazê-la.

 



E até conseguiste dar-lhe seguimento com os outros singles.

Exacto, dei continuidade com outras músicas, que também tiveram sucesso e foram bem recebidas. Se calhar não tanto no campo pop e mainstream, mas penso que dei um seguimento coeso e que consegui atingir bem aquilo que queria e tinha imaginado para ser o meu disco e os meus singles.

O ano passado andaste bastante na estrada, provavelmente foi o ano em que tiveste mais concertos. Tens alguma história engraçada que possas contar? Alguma coisa que te tenha surpreendido?

O ano passado foi uma cena incrível. Foi um ano de sonhos. Nós tivemos 80 concertos, para aí, que foi mais do que eu dei no resto da minha vida. E foi, sem dúvida, uma rotina de trabalho e de espectáculos que não conhecia. Há muitos episódios que me lembro, mas nenhum em concreto a que pudesse dar uma importância maior…

Começaste a fazer o disco antes de ir para a estrada, suponho…

Não. Quer dizer, eu tenho que dizer que comecei a fazer o disco desde o momento em que faço o primeiro som para o disco, que é “As Coisas”. Para já, estava muito mais na estrada do que no estúdio. E fui fazendo singles e trabalhando em músicas quando tinha tempo, e quando estava agendado. Fui lançando músicas um bocado singulares, todas a seguir a linha de pensamento que queria. Dediquei-me mais a fechar o projecto no final do ano depois de terminar os concertos.

 



Essa série de concertos acabou por influenciar a sonoridade do disco? Passas do Alentejo para um andamento diferente…

Eu acho que acentuou algumas coisas que já faziam parte da minha personalidade. Acentuou alguns sentimentos e ideias que eu tinha previamente. Mas não sei até que ponto, percebes? É uma coisa que se calhar só vou conseguir ver com algum distanciamento.

Actuaste com a Matilha em alguns gigs, mas nenhum dos membros aparece no disco, tirando o Sims, claro, que te tem acompanhado sempre na estrada. Isso foi propositado? Ou seja, estás a olhar para o disco e a pensar, “isto é um período novo, mas esperem aí que já vos venho buscar a todos”. 

Eu vou-te dizer: eu tinha mais uma música prevista, quer dizer, mais do que uma, para acrescentar a este disco. Mas uma delas… fiquei com 12 sons e depois retirei esse, que era com o D. Beat, que canta comigo. E era um som muito mais rap, muito mais corrido, muito mais aquelas rimas afiadas e multies. E achei que não fazia parte daquela imagem que eu queria dar ao disco. E quero fazer essa parte provavelmente este ano… Ainda vou trabalhar muito em estúdio neste Verão, mas quero fazer isso aparte deste projecto. A Matilha vai ser sempre o meu grupo. Vou levá-los para a estrada sempre que tiver oportunidade de fazê-lo. Se deus quiser, no próximo arranque a sério de concertos no final deste ano poderei trazê-los sempre que valer a pena. E é, sem dúvida, uma coisa que vai fazer parte sempre da minha música.

O Lhast continua a ser parte importante do teu processo criativo, mas há outro nome que se repete: DJ Sims. Fizeste um disco com outras pessoas, mas eles estiveram sempre próximos do que se estava a passar? 

O Simão teve sempre muito perto. É o meu DJ. Trabalho com ele desde sempre. E as demos passam por ele muitas vezes. Gosto de ouvir a opinião dele. É uma pessoa com quem estou há muitos anos e respeito muito o trabalho dele até hoje e a história dele enquanto DJ do nosso rap. Como fez sempre parte, convidei-o para duas músicas neste disco e acabou por só sair na introdução. Fazia questão que estivessem lá os cortes dele. E acho que fez todo o sentido começar o disco com o meu DJ, uma pessoa tão brilhante como ele é.

 



Quero falar de todos os colaboradores que tens no álbum. O Cookin’ Soul…

Comprei o beat. O Cookin’ Soul é da Universal de Espanha. Houve facilidade no contacto.

E como é que encontraste o instrumental? Foste à pesquisa?

Não, recebi. Falámos directamente por e-mail. Recebi alguns beats e curti bué este, curti a vibe que aquilo me dava. Achei que era a cena indicada para começar o disco. Procurava algo mais boom bap que me levasse mais à origem e que levasse as pessoas à origem em termos de sonoridade. E pronto, foi assim.

O DJ Ride…

O Ride conheci-o pessoalmente. Nós já tínhamos trocados algumas ideias. Não me lembro se ele me enviou mais beats ou não. Na altura sei que chegou àquele beat que acabou por ser o som. Curti muito e saiu-me logo uma vibe fixe, um refrão… Já não me lembro como é que agarrei, mas sei que gostei muito do instrumental.

A maior surpresa é a presença da Raquel Tavares. Como é que isso aconteceu? Suponho que tenha algo a ver com o Diogo Piçarra, que também está envolvido nessa música. 

Eu pedi ajuda ao Diogo para o refrão dessa música. Eu tinha já a ideia, o tema, algumas coisas pensadas e pedi-lhe ajuda para fazer a ponte para uma voz feminina no refrão. Eu tinha pensado numa fadista e surgiu o nome da Raquel. Achei que seria perfeito. Felizmente ela concordou e gostou muito do tema. E foi incrível trabalhar com ela. Acho que é uma pessoa com muito talento, uma voz incrível e uma presença brutal. E gostei muito do resultado.

E a ligação com o Diogo? 

O Diogo é da minha editora. Partilhamos managers, etc.. Isso tornou-nos amigos. Dou-me muito bem com ele. Gosto muito do Diogo. Uma pessoa em quem confio totalmente e que acho mega profissional. Adoro a forma como ele leva a vida e a carreira profissional. E é uma pessoa que está sempre disposta a ajudar. Nesse som também convém falar do J.Cool…

 



Claro que sim. Estiveram todos juntos em estúdio?

Estivemos juntos e surgiu a ideia e o refrão. Eles, o Diogo e o João, trabalharam sempre mais próximos um do outro do que propriamente de mim. Chegaram àquela receita de refrão que curtimos muito. Eu depois acrescentei os versos e eles deram continuidade ao som. Até trabalharam na pós-produção com o Mic Sine. Foram os cérebros desse instrumental.

Passando para o Agir: tiveste alguma mão na produção do tema?

Conheci o Agir há algum tempo. Uma pessoa que também gostei muito de conhecer. Um gajo que é muito bom produtor, com uma visão diferente de muita gente. É muito único o olhar dele para a música e para a carreira. Gostei muito de partilhar essas ideias com ele. Estivemos em estúdio, eu cheguei ali a um género de refrão. Uma vibe que curti nesse instrumental, levei para casa e gravei lá. Por isso é que ele me está a dar o crédito de produção. Em termos estruturais da música fui eu que decidi para onde ir, as bridges, etc.. Tentei levar as coisas de uma forma mais minha, até porque estava sozinho.

Fumaxa: A escolha deste beat também é uma agradável surpresa. 

Eu adoro esse instrumental. Acho que é dos instrumentais mais incríveis do disco. A letra levou-me para um lado mais pessoal. Acho que não faria single dessa música, mas é a música mais pessoal, de longe. Parece que estou a escrever para mim próprio, e se calhar até estou. O instrumental achei incrível, as guitarras que ele acrescentou depois… uma coisa brutal. Gosto muito dessa música. Foi muito fixe trabalhar com o Fumaxa e conhecê-lo pessoalmente.

E como é que o conheceste?

Já nos tínhamos cruzado. Já nos conhecíamos através do Bispo. Combinámos, fomos para estúdio, escolhemos um beat, desenvolvemos ali umas cenas e pronto. Essa também acabei por gravar em minha casa.

O último é o Fabrice. 

O Fabrice conheci-o na Big Bit. Penso que ele estava lá a trabalhar. Um miúdo que eu considero muito talentoso. Muito bom produtor. Gostei muito de o conhecer. E adorei o beat, adorei o que aquilo me trouxe na letra. Não tinha encontrado um som perfeito para fechar o disco, que conseguisse dar a mensagem que eu queria dar na última música e o Fabrice foi um ponto importante nessa altura.

 



Para além da Raquel Tavares, as tuas duas únicas participações vocais são o Slow J e o ProfJam. Para mim, vocês representam uma “armada” hip hop que está mais preocupada com a música do que com pré-requisitos do rap. Foi com isso em mente que abordaste este disco? Isto não é um disco rap puro e duro e se calhar era isto que querias fazer desde o início. 

Concordo contigo em tudo o que disseste. Obviamente que pertenço a essa cultura — sempre pertenci. Independentemente da música que faça amanhã, não quer dizer que alguma vez deixe de ser hip hop ou respirar hip hop. Em relação à música, acho que não tem de existir limitações. A própria evolução do rap para os traps e para tudo o que está a existir hoje é a prova disso. Para mim, ficar estagnado não serve. Eu gosto de procurar novas melodias, novas coisas. E acho que é importante.

O que é que estás a preparar para os concertos de apresentação do disco?

Eu quero que seja uma apresentação que se enquadre na musicalidade do disco. Não é um disco de let’s go party. É uma coisa de boa vibração, calma e com uma poesia lenta.

Quando estava a ouvir o álbum, veio-me à cabeça que uma banda iria muito bem com estes temas. Vais manter o mesmo formato?

Para já vou. Não quero avançar já para esse lado. Claro que a minha ideia a longo prazo passa por aí. E acho que vai ser importante quando existir essa viragem, mas para já quero dar o mesmo tipo de concerto porque também não vou só dar estas músicas.

 


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