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Publicado a: 02/06/2015

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O novo projeto de um artista cujo trabalho seguimos e idolatramos tanto pode ser um tema de conversa para as próximas semanas como um desmoronamento das expectativas que tínhamos. Curiosamente, Dark Red, a segunda longa-metragem de Shlohmo (pseudónimo do produtor Henry Tauler), foge às regras e consegue ser uma mistura dos dois. Por um lado, a edição deste novo disco foi o fim de mais de quatro anos de espera por um sucessor de Bad Vibes, lançado em 2011; por outro, o seu registo habitual está (quase completamente) virado do avesso, e isso não é necessariamente mau. Uma maior predisposição e sensibilidade são elementos-chave para o entendimento de uma peça como Dark Red; porque este disco não está pensado para agradar ao primeiro play.

Apesar de 2014 ter sido um ano repleto de colaborações e novos projetos (i.e o EP No More, com Jeremih), foi também um ano registado por uma série de perdas pessoais e complicações profissionais, que Tauler confirmou serem a matriz temática para o seu novo trabalho, numa entrevista à Passion of Weiss. Com selo de aprovação das editoras Wedidit (detentora de nomes emergentes como Groundislava, RL Grime e do português Purple) e True Panther (responsável por referências de maior abrangência como Cloud Nothings, Unknown Mortal Orchestra e Ty Segall), este é um álbum que espelha a alma de quem o fez, onde os sentimentos são postos a nu e onde a barreira entre a ficção e o real deixou de existir.

Mas o desafio imposto ao artista reside precisamente aqui: na capacidade de se superar, obra após obra. Saber dar uso à versatilidade sem deixar de ter o sentido qualitativo em mente. Shlohmo soube fazê-lo e consegue aliciar-nos para um mundo paralelo à sonoridade a que nos habituou, onde o flow de um jazz futuristicamente abstracto de Bad Vibes dá agora lugar a um grime electrónico dificilmente decifrável de Dark Red (este disco podia facilmente chamar-se “Worse Vibes”). Mas não o condenamos por isso. Se os horizontes da mente estiverem predispostos, notamos que faixas como “Slow Descent” e “Buried” são um distanciamento de todos os rótulos genéricos em que teimamos inserir àquilo que ouvimos.



Damos por isso e estamos no epicentro da problemática que dá forma e identidade a este álbum. A angústia emocial entra em cena – personificada pelos excertos vocais que ecoam entre os ritmos impostos pelos sintetizadores. Faixas como “Apathy” (sublime contribuição de D33j) e “Relentless” entorpeçam-nos a mente e ali nos deixam a questionar a força do inevitável, e quando damos por isso já estamos envoltos na espiral de uma trip introspectiva que desce ao lugar mais fundo da consciência. Felizmente, o ambiente vai-se tornando mais fluente até à chegada das duas últimas músicas, sendo “Beams” a katharsis de DnB que Shlohmo encontrou para finalizar a sua perfect storm e que nos relembra o porquê da abrangência do seu nome.

Como é habito, Henry Tauler volta a usar os synths e restante parafernália produtiva do seu pai para dotar o seu som – que se quer moderno – de um toque vintage. Seja na nuvem organicamente digital e melancólica de Bad Vibes ou na tempestade decadente e caótica de Dark Red, Shlohmo continuará a ser um arquétipo do estilo electrónico para quem um espaço como o Musicbox já é demasiado pequeno para acolher a grandeza do seu registo.

Dark Red é, acima de tudo, a tangência entre a realidade crua e a ficção idílica.

Faixas essenciais: “Buried”; “Apathy”; “Relentless”

 

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