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Publicado a: 04/10/2017

Quatro tesouros da electrónica na fornada mais recente da espanhola Wah Wah

Publicado a: 04/10/2017

[FOTO] Direitos Reservados

A loja e editora catalã Wah Wah tem sabido acompanhar o movimento global de arqueologia electrónica com uma série de relevantes reedições que têm marcado o reencontro do presente com alguns artefactos curiosos, daqueles que são quase impossíveis de encontrar nas versões originais para todos os que não estejam a gerir uma generosa carteira de fundos monetários com origem na Arábia Saudita ou algo que o valha.

Só este ano, o catálogo da Wah Wah já conta com dezena e meia de novas entradas que cobrem um vasto terreno que se estende da música concreta ao krautrock, do hard rock ao rock psicadélico. Por aqui escolhemos quatro superiores exemplos de arqueologia electrónica que representam um período que abarca os anos de 1962 a 1979, aqueles em que foram lançados originalmente os trabalhos de Jean-Jacques Perrey e de Didier Bocquet que o selo espanhol agora recolocou nos escaparates, juntamente com os trabalhos de J.B. Banfi e Zweistein de 1978 e 1970, respectivamente.

Com edições sempre devidamente cuidadas do ponto de vista técnico – boas capas, boas prensagens – efectuadas sempre que possível a partir de masters originais e com relevantes anotações, estes títulos do catálogo da Wah Wah – quase sempre disponíveis em prensagens limitadas – são adições imbatíveis a qualquer discoteca que procure traçar a história da música electrónica. Claro que qualquer visita a Barcelona não ficará completa sem uma visita a esta magnífica loja…

 


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[JEAN-JACQUES PERREY] Musique Electronique du Cosmos

Dana Countryman, autor do livro Passport to The Future: The Amazing Life and Music of Electronic Pop Music Pioneer Jean-Jacques Perrey, assina as notas do insert em que se explica que além do material da edição original de 1962 (limitada à época a 500 exemplares), acomodado no lado A desta reedição, este LP inclui ainda material de um acetato muito raro de que se conhece apenas um exemplar que foi adquirido no eBay pelo coleccionador e DJ espanhol DJ Zero, acreditando-se que contenha música gravada algures durante a década de 60, provavelmente antes da edição de The In Sound From Way Out, o clássico que o músico francês pioneiro do uso de instrumentos electrónicos lançou na Vanguard em 1966. Jean-Jacques Perrey faleceu na recta final de 2016 e deixou uma magnífica obra que é uma visão do futuro. A música contida nesta reedição da Wah wah funciona como uma cápsula do tempo que nos permite revisitar o espírito exploratório que animava pioneiros como Perrey que estavam, de facto, a procurar inventar uma nova linguagem musical.

 

https://www.youtube.com/watch?v=TWT3GrcCy4E


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[ZWEISTEIN] Trip . Flip Out . Meditation

Esta é a mais ambiciosa das edições aqui apresentadas, com a Wah wah a respeitar meticulosamente um original que de acordo com o Popsike bate bastas vezes a marca dos 500 euros no mercado especializado. Trabalho único do projecto Zweistein lançado originalmente em 1970 na etiqueta Philips, Trip . Flip Out . Meditation é um LP triplo de colagens electrónicas imaginadas e realizadas por Suzanne Doucet – figura que tinha carreira nos domínios da pop e era presença frequente na televisão germânica – com a ajuda da sua irmã Diane e de Peter Kramper, engenheiro de som alemão que chegou a tocar sintetizador em discos dos Amon Duul ou Utopia.

O álbum é uma sucessão de estranhas colagens que o alinham com alguma música concreta, mas também inclui passagens mais meditativas que já antecipam algumas das marcas da new age em que mais tarde Suzanne Doucet se haveria de notabilizar, nomeadamente através de edições na etiqueta Isis Music. São quase duas horas que parecem equivaler ao mergulho num sonho profundo feito de fantasmas e figuras etéreas, de florestas onde o sol mal entra e de cavernas misteriosas. Sim, é esse tipo de disco.

A reedição da Wah Wah foi autorizada por Suzanne Doucet, vem com áudio remasterizado, um 7″ bónus com material extra-álbum original e respeita o design da capa de 1970 que se apresentava impressa em prateado com um espelho no centro. Uma peça de colecção limitada a 500 exemplares que está destinada ela mesma a ver o seu preço actual – de cerca de 60 euros – ser valorizado com o tempo.

 

https://www.youtube.com/watch?time_continue=6&v=y-24j8G4AjQ


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[JB. BANFI] Galaxy My Dear

Oportuno relançamento de uma pérola perdida do homem que gravou com o grupo de culto Biglietto Per L’Inferno, grupo italiano alinhado com as experiências Kraut da primeira metade dos anos 70. Este álbum foi originalmente lançado em 1978 e é uma sentida vénia ao trabalho do mestre Klaus Schulze que, aliás, haveria de produzir e editar os dois registos seguintes de Banfi na sua própria Innovative Communication: Ma, Dolce Vita e Hearth, ambos assinados por Baffo Banfi (Giuseppe Baffo Banfi é o seu nome verdadeiro) em 1979 e 19781, respectivamente.

Este álbum, no entanto, foi inteiramente gravado por J.B. Banfi na sua própria casa, com recurso a sintetizadores e gravadores domésticos e um sentido exploratório educado na discografia então já significativa dos Tangerine Dream de Schulze e Florian Fricke, mas também atento às experiências do conterrâneo Franco Battiato (cujos álbuns clássicos de experiências electrónicas acabam igualmente de merecer reedição, essas a cargo da americana Superior Viaduct – mantenham-se atentos a este espaço para artigo em breve logo que as edições já encomendadas aterrem no quartel general do ReB). As notas de capa vêm com assinatura do próprio Banfi e o trabalho, ao que tudo indica, foi remasterizado a partir das fitas originais. Edição limitada a 500 exemplares.

 


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[DIDIER BOCQUET] Voyage Cerebral

Este quarteto de relançamentos Wah Wah completa-se de novo com input francês, só que quase duas décadas separam Voyage Cerebral do pioneiro trabalho de Jean-Jacques Perrey que começámos por abordar neste artigo.

Alinhado igualmente com os ventos que sopravam de Berlim, este segundo trabalho de Didier Bocquet sucedeu a Eclipse de 1977 e apesar de ser também uma produção caseira saiu já com o carimbo da mítica FLVM (etiqueta cuja sigla significava Fait Le Vous Même, ou seja Faça Você Mesmo, uma tradução directa do mantra ideológico do punk, “do it yourself”). E tal como o italiano J.B. Banfi olhava para os alemães Tangerine Dream sem deixar de acusar o toque local de exploradores conterrâneos como Franco Battiato, também o francês Didier Bocquet se inspirava no som kosmische sem deixar de estar atento ao que gente como os Heldon de Richard Pinhas ia produzindo em França desde meados da década de 70.

Ouvir este Voyage Cerebral significa sintonizar os nossos ouvidos com as promessas tecnológicas de uma época, com a vertigem de possibilidades de um novo discurso musical que os sintetizadores facilitavam. Ouvir este disco hoje é, enfim, perceber como se vislumbrava o futuro a partir de finais da década de 70. Edição igualmente limitada a 500 exemplares.

 

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