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Publicado a: 09/10/2017

Prologue, a primeira festa da Point: ich bin ein berliner!

Publicado a: 09/10/2017

[TEXTO] Manuel Rodrigues [FOTOS] André Leiria

Os primeiros minutos da nossa experiência na primeira festa da Point desenrolam-se numa intensa procura do local escolhido para a realização do evento. Barracões é coisa que não falta em Lisboa, principalmente nos espaços que ladeiam a avenida 24 de Julho, por isso, recorremos à sabedoria popular e deixamo-nos orientar pelo som, que reza ser, nestas situações, a melhor bússola para nortear os nossos sentidos. Seguimos pela rua das Janelas Verdes, guiados por um generoso conjunto de décibeis que vai aumentando o seu volume consoante a aproximação, contornamos o prestigiado restaurante Le Chat e esbarramos contra um gigantesco portão de alumínio, corrido quase até ao fim, apenas com uma pequena fenda na parte inferior que deixa passar som e uma irrequieta luz vermelha. Não precisamos ser nenhuns génios da física para perceber que naquela brecha não cabe um corpo humano e que, por isso, estamos na porta errada.

 


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A solução passa por contornar o edifício até encontrar algo com ar de entrada, ou até mesmo um porteiro, quiçá um segurança. Descemos a escadaria que faz a ligação entre a Rua das Janelas Verdes e a Avenida 24 de Julho, viramos à esquerda e, depois de uns quantos metros a pé, lá encontramos um beco estreito com alguns elementos da organização a tratarem das entradas. Confirmam-se os nomes, começa a aventura. O acesso ao barracão que alberga a festa é feito ao longo de uma escadaria que traz à memória as centenas de degraus do Bom Jesus do Monte, em Braga. É nesta altura que a frase “see you in the dark”, presente na comunicação do evento, começa a fazer sentido. A escuridão invade os corredores, halls e divisões deste espaço, e só uma luz vermelha nos auxilia nesta sinistra caminhada, ao bom estilo dos primeiros segundos do filme Irréversible, de Gaspar Noé (excluindo as cenas de orgia, claro). Se a ideia é ser underground, então estamos a rumar na direcção certa.

No espaço principal, vulgo dancefloor, as características repetem-se. Baixa luminosidade (para não dizer quase nenhuma), ambiente sinistro e, no fundo da sala, a escassos metros da bancada de DJ, várias dezenas a dançarem na cadência da música, emanada a partir de uma vistosa e poderosa aparelhagem. Na extremidade oposta, junto ao portão de alumínio que no início da noite nos induziu em erro, é possível encontrar uma escadaria que, por esta hora, serve de bancada àqueles que, aqui presentes desde as quatro da tarde, procuram dar descanso ao esqueleto. Luigi Tozzi segura as rédeas e guia-nos através de ambientes profundos e envolventes, também eles um tanto ou quanto obscuros, que encontram nas paredes de tijolo e nas restantes estruturas de pedra a melhor forma de se repercutirem. Reconhecimento feito, hora de ir ao balcão recarregar as energias gastas na escalada desta montanha íngreme e de cor escura, que, a avaliar pelo calor que se faz sentir no seu cume, será certamente de origem vulcânica.

 


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O local escolhido para a realização da Prologue, nome dado à primeira festa da Point, não podia ter sido melhor a nível de envolvência, pois, apesar de à vista desarmada não passar de um barracão abandonado junto a uma das avenidas mais movimentadas de Lisboa, este espaço, nestes contornos, tem a particularidade de nos transportar para um dos maiores bastiões da música electrónica mundial, a imponente cidade de Berlim. O carácter industrial está bastante presente, começando na própria arquitectura do edifício, que não deixa qualquer dúvida relativamente à natureza das vigas que o sustentam, passando pela sua acústica, que embrulha a música proposta numa espécie de manto fabril, e acabando, claro, no acesso quase secreto ao dancefloor, onde, neste preciso momento, Edit Select, alter ego do produtor de renome Travis Scott, serve um set enérgico e possante. Nem John F. Kennedy diria melhor: hoje, somos todos berlinenses.

O público, por sua vez, vai recorrendo às mais variadas técnicas para passar o tempo. Uns optam pela dança, na habitual purga sugerida por este género musical, outros completam mais um circuito entre a plateia e o bar, numa incansável prova de endurance contra as altas temperaturas sentidas no interior desta chaminé vulcânica, e há até quem se tenha lembrado de trazer um dinossauro insuflável para a pista – não duvidem da nossa sobriedade, isto aconteceu mesmo. As últimas ondas sonoras da noite são servidas pela mão do DJ e produtor Takaaki Itoh, detentor da editora WOLS e conhecido pela sua sonoridade própria nos meandros do techno. É com este cenário e ao som de bombos cheios e pratos de choque soltos e bem definidos que nos despedimos do prólogo de uma – esperemos nós – longa história de festas, ao mesmo tempo que lançamos o olhar por uma das muitas janelas aqui presentes (que possibilitam uma vista incrível sobre a cidade) e imaginamos uma Lisboa que podia ser mais vezes Berlim.

 


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