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Publicado a: 07/01/2018

Os 10 melhores álbuns internacionais de 2017

Publicado a: 07/01/2018

[ILUSTRAÇÃO] Abel Justo

Não é por acaso que todas as escolhas internacionais são criações de artistas norte-americanos. No ano em que Donald Trump tomou posse como Presidente dos Estados Unidos da América, a música soou como uma espécie de ataque conjunto contra a estupidez: o arsenal massivo de DAMN. e Big Fish Theory, o abstraccionismo de Drunk, os renascimentos credíveis de Rap Album Two e You Only Live 2wice, a sinceridade desconcertante de 4:44 e Ctrl, o espelho do presente de At What Cost, a consciência social de The Iceberg e os restos da Terra do Nunca de Flower Boy são armas nucleares que podem destruir qualquer império do mal. Bem, tudo isto na teoria, obviamente… porque ninguém aqui está disposto a carregar no botão…

 


[KENDRICK LAMAR] DAMN.

Há algo significativamente diferente em DAMN.: no álbum anterior, K.Dot envolveu as suas palavras numa mistura experimental de funk, soul e jazz, a música que serviu de veículo a algumas das mais revolucionárias ideias cantadas durante o Movimento dos Direitos Civis, nas décadas de 60 e 70 do século passado; agora, os beats revelam menos interacção colectiva no estúdio e mais a gestão de regra e esquadro que os produtores conseguem nos seus laptops. Os beats ecoam o presente, o que significa que além de lutar por si mesmo, Kendrick está igualmente a falar para dentro do hip hop: “Last LP”, explica ele em “ELEMENT.”, “I tried to lift the black artists / But it’s a difference between black artists and wack artists”. E talvez seja por isso que, com a excepção das contribuições do ainda desconhecido Zacari e de Rihanna e Bono dos U2 (curioso que eleja um perfeito desconhecido para surgir ao lado de duas estrelas globais…), Kendrick se apresente praticamente sozinho por aqui. É solitário no topo, sobretudo porque olhando em redor não se vê mais ninguém.

– Rui Miguel Abreu


[THUNDERCAT] Drunk

Este tipo que tem nome de super herói da Hanna Barbera ou algo que o valha é um incrível baixista que se tem notabilizado pelo trabalho com o beatmaker Flying Lotus ou com o rapper Kendrick Lamar: as suas malhas adornam várias das faixas de To Pimp a Butterfly e Untitled Unmastered. Músico incrível, já se está a ver, que marcou 2017 com o seu singular Drunk. Mas se Thundercat está bêbado é de ideias, de grooves, de grande música. Antes do álbum sair largou dois singles, um deles com os veteranos do soft rock Kenny Loggins e Michael MacDonald. Depois saiu uma incrível faixa em que se cruza com Kendrick, “Walk On By”. E só depois se revelou na totalidade um álbum inspirado no lado mais acetinado do rock, nos Fleetwood Macs da nossa imaginação colectiva, que conta ainda com participações de Wiz Khalifa ou Pharrell. Caso para se vestir a melhor camisa de seda, levar os pensamentos até Miami e carregar no play

– Rui Miguel Abreu


[JONWAYNE] Rap Album Two

A prova de que é possível regressar da reforma para trabalhar ao mais alto nível. O percurso de Jonwayne conheceu dias difíceis, que o levaram a sair da emblemática Stones Throw. Em 2015, o rapper e produtor chegou a declarar Jonwayne Is Retired, isto quando tinha já alcançado o estatuto de figura de culto, com uma base de fãs consistentes e sedentos por novidades.

Rap Album Two acabou por vir ao de cima, uma espécie de confessionário que tem em “These Words Are Everything”, o seu expoente máximo. O disco é a materialização da cura para o forte problema de alcoolismo que assombrou os momentos mais altos da sua carreira, bem como a prova de que todos temos direito a uma segunda vida quando se estabelecem princípios para o nosso próprio bem. Bem-vindo de volta, Jonwayne. Podes reentrar, agora pela porta grande se faz favor.

– Gonçalo Oliveira


Jay-Z // 4:44

[JAY-Z] 4:44

Entre marido e mulher não se mete a colher. Mas experimentam colocar a música entre cônjuges: pode ser que resulte. A terapia de casal resultou num álbum que juntou No I.D. a Jay-Z, dupla improvável nesta altura do campeonato. Contudo, os resultados não poderiam ter sido melhores — por exemplo, Jay-Z é o artista com mais nomeações para a próxima edição dos GRAMMYs.

Para além da qualidade das histórias, do tom confessional — que também consegue ser bem-humorado ou crítico — e dos instrumentais infalíveis do produtor de Chicago, a ligação com Portugal torna-o peça de museu. Afinal de contas, quantos de nós pensámos que seria possível ouvirmos a voz de José Cid e Tozé Brito ao lado da de Jigga?

– Alexandre Ribeiro


[ODDISEE] The Iceberg

Têm sido anos produtivos para Amir Mohamed El Khalifa, vulgo Oddisee, que em 2017 brindou o seu público cada vez maior — basta pensarmos na sala esgotada para o ver no Vodafone Mexefest, em Lisboa — com The Iceberg. Oddisee está naquela lista de meia dúzia de nomes que produz tão bem quanto escreve, que é tão produtor como rapper, a um nível elevadíssimo de qualidade.

Existe a musicalidade orgânica, alegre, espiritual: o groove soulful clássico mas fresco, sem qualquer vestígio de pó, que nos é familiar mas ao mesmo tempo soa a novo. Os instrumentais são como um pergaminho para a palavra do profeta que a América de Trump — ou a de Obama, também, como nos disse em entrevista — precisa. O mundo seria um sítio melhor se todos ouvíssemos The Iceberg.

– Ricardo Farinha


[TYLER, THE CREATOR] Flower Boy

São discos como este que nos fazem jurar a pés juntos que, afinal, a maturidade é uma coisa bonita. Depois dos versos mais controversos e maquiavélicos a que deu voz aquando o aparecimento dos Odd Future, Tyler tem-se mostrado, aos poucos, cada vez mais “crescido”. Se há 10 anos era apenas um adolescente a brincar aos adultos, em Flower Boy olhamos para um homem maduro que nunca perde o seu humor juvenil.

Musicalmente, Tyler, The Creator está cada vez mais arrojado, não se contentando com o lado mais minimal da música, tal como se apresentou ao público pela primeira vez. Destacam-se as influências de Pharrell, que depois da parceria em Cherry Bomb volta a colaborar com o Flower Boy, e o lado mais sonhador do universo jazz, aqui retratado sob a forma de arpeggios e sequências de acordes como base para as suas melodias.

Como se não bastasse, Tyler pode muito bem ter sido o protagonista do melhor Tiny Desk Concert do ano passado. Caetano Veloso, que tal um pouco de sangue novo para ajudar a produzir o próximo disco?

– Gonçalo Oliveira


[VINCE STAPLES] Big Fish Theory

O único rapper que merece um álbum inteiramente produzido pelo enigmático Burial. Um álbum que soa a algo vindo de um universo em que Sun Ra, o autor de Untrue e os Underground Resistance convidavam Vince Staples para uma jam. Depois de Summertime ’06, o artista de Long Beach, Califórnia, volta a afirmar, através da sua música, que é uma das vozes mais importantes desta geração. E fá-lo da maneira menos óbvia possível.

– Alexandre Ribeiro


[FREDDIE GIBBS] You Only Live 2wice

O rapper, que já alinhou ao lado de Madlib no instantaneamente clássico Piñata, deu de caras com a luz ao fundo do túnel, isto depois de alguns meses problemáticos em que teve de enfrentar acusações de violação. Tudo aquilo que construiu até agora esteve preso por um fio que, ao mais ligeiro dos solavancos, poderia arruinar uma carreira – e uma vida – para sempre.

Gibbs soube renascer e You Only Live 2wice serviu de confessionário para todos os pensamentos que lhe ocorreram quando se viu prestes a ficar no meio do nada. Melhor ainda quando se consegue transportar o feeling mais cru e old school para cima das batidas que a nova geração do hip hop vai plantando no seu jardim. “I’ll show you how in one summer one nigga could lose it all.” Tudo está bem quando acaba bem.

– Gonçalo Oliveira


[GOLDLINK] At What Cost

O rapper americano de 24 anos conquista um lugar na lista dos melhores álbuns do ano com um disco plural, recheado de texturas e sonoridades distintas. Dono de flows generosos, por vezes GoldLink pega no microfone para entregar barras determinadas, noutras ocasiões solta versos cantados hipnotizantes. Tudo por cima de tapetes ricos de instrumentais, de várias cores e feitios, com influências electrónicas, r&b, quando é preciso, e funk, que tornam este trabalho numa peça fresca – até porque o artista também tem um pé no que mais de contemporâneo e trendy se faz no hip hop.

– Ricardo Farinha


[SZA] Ctrl

“Solána, middle fingers up, speak your truth”, atira Kendrick Lamar no final do seu verso em “Doves in the Wind”, resumindo, acertadamente, o estado de espírito de Ctrl, o álbum de estreia da diva da TDE. Sem máscaras e com as inseguranças expostas, SZA colocou-se por inteiro num disco que põe à prova a sua capacidade para escrever — e passa com distinção no exame. Durante 49 minutos, SZA abre-nos a porta de “casa” e serve como guia para o seu próprio mundo. Aviso: as músicas não são para os mais sensíveis…

– Alexandre Ribeiro

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