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Publicado a: 15/02/2018

Morgan Heritage: “Quando fazes isto há 20 ou 25 anos, tem que ser por muito mais que os prémios”

Publicado a: 15/02/2018

[TEXTO] Núria R. Pinto [FOTO] Direitos Reservados

Se há algo do qual Denroy Morgan se pode orgulhar é, com certeza, da herança que os seus filhos decidiram agarrar quando, em 1994, tomaram o caminho do pai. Por esta altura, já sabemos muito bem que não só de Marleys vive o reggae e, prova disso, são os Morgan Heritage. Com cerca de 25 anos de carreira, um Grammy e uma nova nomeação em 2017, a banda regressa a Portugal para apresentar Avrakedabra, a 16 e 17 de Fevereiro, no Capitólio e no Hard Club, respectivamente.

Ao telefone a partir de Paris, Memmalatel “Mr. Mojo” Morgan falou ao Rimas e Batidas sobre as mais recentes conquistas enquanto grupo, o mais recente trabalho e o lugar do reggae no mundo em 2018.

 



Antes de mais nada, queria dar-vos os parabéns pela nomeação para os Grammy Awards com este último álbum e, na verdade, começar exactamente por aqui. Vocês ganharam um Grammy, em 2015, pelo Strictly Roots e agora voltaram a ser nomeados com Avrakedabra… O que é que isso representa para vocês, quase 25 anos depois de terem começado?

Acho que podemos usar aquela metáfora de um bom vinho ou de um fruto que vai amadurecendo à medida que o tempo passa e está óptimo para se comer! (Risos) A nossa carreira avançou para um lugar onde, actualmente, podemos dizer que temos uma base de fãs diversificada e de todas as idades… E à medida que vamos lançando nova música e colocando essa mesma música à mercê de novos públicos percebemos que essa base continua a crescer e, portanto, o reconhecimento também vem daí. De diferentes formas, aliás, e receber um Grammy é apenas uma delas. Naturalmente, sentimo-nos muito agradecidos por todo o reconhecimento que recebemos dos nossos colegas e da indústria…

Achas que é melhor ainda receber este prémio 25 anos depois? Depois de tanto esforço e desta jornada tão longa?

É claro que este reconhecimento não tem comparação porque é o galardão mais prestigiante que podes receber na música. Mas é como disseste, quando fazes isto há 20 ou 25 anos, tem que ser por muito mais que os prémios, não é? A mensagem, a música e a forma como as pessoas a recebem e todo o apreço que demonstram pelo trabalho que temos vindo a lançar, ano após ano… isso é aquilo pelo qual estamos bastante mais agradecidos.

Tanto o Strictly Roots como agora o Avrakedabra, pelo que sei, foram gravados enquanto estavam em tour e não num único estúdio. Achas que encontraram uma fórmula que se adapta melhor a vocês? E uma receita para o sucesso, digamos?

O Strictly Roots foi gravado em estúdio embora para trás e para frente, entre a Jamaica, Miami e o nosso estúdio móvel… Íamos gravando algumas coisas enquanto estávamos a apresentar o Here Come The Kings. Mas foi, maioritariamente, produzido entre a Jamaica e a Flórida. Já o Avrakedabra, sim, foi fruto principalmente da nossa motivação em ir agarrando a inspiração à medida que ela ia surgindo! É muito difícil para uma pessoa criativa lidar com a ausência de inspiração, seja ela nas artes, na pintura ou até no desporto e no entretenimento… E na música, quando tens encontrar acordes e melodias. Portanto, quando ela surge, temos que arranjar formas, como disseste, de gravar com qualidade suficiente e ir a um qualquer estúdio tentar criar uma música ou gravar um pedaço de áudio…

Achas que vão continuar com esse processo, então?

Sim e nunca mais deixámos de o fazer, na verdade, desde que surgiu a tecnologia que começou a permitir que materializássemos isso a partir de qualquer lugar. E cada vez mais, se olharmos para os créditos dos nossos álbuns, têm vindo a surgir as referências ao nosso estúdio móvel! [Risos] Podemos até juntar todas as peças em estúdios maiores mas grande parte das vozes são gravadas na estrada!

Neste momento, já não existe necessidade de se apresentarem ou marcar o vosso posicionamento, digamos assim, porque toda a gente vos conhece…

[Risos] Sim!

Exacto! E no Avrakedabra o vosso foco parece ter mudado, lá está, para trazerem novos artistas e novas influências convosco. Músicos como Dre Island, Kabaka Pyramid, por exemplo… Queres falar-me um pouco desta nova abordagem?

É importante para nós mostrar aquilo que é o futuro e o estado actual da música. O reggae já é global e, mesmo no Strictly Roots, trabalhámos com jovens artistas como o Chronixx, o filho do Stephen Marley, Jo Mersa Marley, o nosso sobrinho Jamere Morgan ou o J Boogs, Erich Rachmany dos Rebelution, Bobby Lee dos SOJA ou até o Shaggy que é uma lenda tal como nós, uma figura icónica para a música jamaicana… Portanto, quando olhas para tudo isso, percebes que estás a trabalhar com artistas que vêm desde a Polinésia Francesa, Samoa, Havai ou dos Estados Unidos e da Jamaica… Artistas que têm uma base de fãs que já é global, como é o caso do Shaggy. E isso mostra-te que o reggae já não é apenas um género que vem da Jamaica mas que é, agora, criado em qualquer parte do mundo. Tem os seus próprios representantes em cada uma destas regiões. África tem os seus próprios representantes de reggae… Europa, Japão, toda a Ásia e, claro, os Estados Unidos. E isso diz-nos, sem dúvida nenhuma, que o reggae é um estilo vivo e que irá continuar vivo por muitos anos. É a única conclusão que podemos tirar daí. Neste novo álbum, a abordagem passou, na verdade, por deixar as coisas acontecer de forma orgânica. Não foi algo que foi muito pensado… Na faixa com o Rock City, que é das Ilhas Virgens, mais especificamente de Saint Thomas, por exemplo, nós entendiamo-nos muito bem e pensamos só, “ei, deixa lá ver como é que isto soa”, e depois ele enviou as ideias dele para o Peetah… A música com Kabaka Pyramid e Dre Island, o Peetah teve uma ideia para o refrão e pensou “quem é que podemos por aqui” e chegámos a estes dois artistas que gostamos e que estão a chegar a agora… É importante para nós dar a conhecer novos talentos, dentro e fora da Jamaica. Quando olhas para os Morgan Heritage Family and Friends, Vol. 1, 2 e 3, vês Ras Shiloh, Bushman, e todos aqueles artistas… Na verdade é algo que temos vindo a fazer desde aí até agora e nesse sentido, especificamente, nada mudou. Juntámos, agora, os dois legados de Ziggy Marley e Stephen Marley na faixa “One Family” e trouxemos algo que nunca tinha sido ouvido antes, Mr. Talkbox que aparece na “24K Magic” do Bruno Mars…

Exacto. Ou até na “LOYALTY.” do Kendrick Lamar…

Sim! E surge na primeira faixa,  “Want Some More” feat. Mr. Talkbox.

Já que estamos a falar de novos artistas: como é que olhas para a actual cena reggae na Jamaica? Pergunto-te isto pois o dancehall é o género que a ilha mais exporta actualmente. Também estive à conversa com a Esther Anderson — realizadora e actriz jamaicana, ex-companheira de Bob Marley — e ela confessava que sentia que o dancehall, tal como é consumido neste momento, não representava a verdadeira cultura musical jamaicana. Partilhas da mesma opinião? Olhas para isso como uma ameaça ou exactamente o oposto?

Depende muito de quem responde a essa pergunta. Na nossa opinião, o dancehall é o reflexo de um determinado sector na Jamaica e essa história precisa de ser contada. Nós iremos apoiar sempre os nossos artistas de dancehall… Acho que as pessoas que estão preocupadas com a influência extrema que o dancehall possa estar a ter agora devem fazer algo em relação a isso. E a única coisa que nós podemos fazer em relação a isso é criar um equilíbrio onde o reggae esteja presente nos lugares onde o dancehall também está. Para que possas ouvir o que a Jamaica tem para oferecer para além do dancehall… Porque como disseste e bem, agora, o dancehall é a música pop que sai da Jamaica. Mas não é o único género e não reflecte, verdadeiramente, aquilo que a cultura jamaicana é. Reflecte apenas uma parte da música jamaicana e essa é a mensagem que tem que ser passada.

A nossa base de leitores é composta, principalmente, por fãs de hip hop e, claro, o hip hop e o reggae cruzaram caminhos muitos vezes no passado. Quais são os teus sentimentos, atuais, sobre a cultura?

O hip hop é nosso! (Risos) Porque, claro, a história do hip hop não é nenhum segredo. Desde que o Kool Herc levou o “sítio” onde se ouvia reggae — que era o verdadeiro “dancehall” — e toda essa cultura para os guetos de Nova Iorque e isso evoluiu para aquilo que chamamos hoje de DJ e depois para aquilo que é o MC de hip hop… E depois o MC passou a ser rapper e a partir daí nasce o género e toda a cultura. Sinto que não há muita diferença entre a cultura dancehall e a cultura hip hop, na verdade, porque são ambos filhos da mesma raíz… Que é o reggae!

Como já referimos antes, os Morgan Heritage foram, juntamente com a família Marley eu diria, responsáveis pela globalização do reggae. Avrakedabra ficou em primeiro lugar no iTunes em 8 países diferentes! Portanto, como é que vocês se vêm nos próximos 25 anos?

Seria muito bom sermos lembrados pela nossa contribuição para o género, no mundo inteiro. Daqui a 25 anos, na verdade. Porque o reggae é um daqueles tipos de música que toda a gente ama apesar de não ser mainstream como outro estilos urbanos, por aí… ou como o próprio Rock. Mas é um estilo de música que faz toda a gente vibrar, aqui e ali, ou que toda a gente ouve em casa ou em privado. Gostamos de pensar no reggae como um dos géneros mais importantes no planeta e enquanto embaixadores do género, criámos o nosso lugar na história, para sempre!

Não é a vossa primeira vez em Portugal — acho que a última vez que estiveram por aqui foi em 2013 com Tarrus Riley, certo? Como é que vos tratámos?

Portugal é a nossa cara! Adoramos Portugal e temos que garantir que não vamos passar novamente tanto tempo sem visitar o país! Esta vai ser a primeira vez, em mais de 10 anos, que vamos voltar a tocar num lugar mais pequeno e íntimo, digamos assim, e estamos ansiosos por estar de volta. Vamos estar em Lisboa e no Porto e vamos, definitivamente, tentar não estar tanto tempo sem regressar a Portugal.

O que podemos esperar de um concerto num espaço mais intimista, como referiste, como é o caso do Capitólio e do HardClub?

Vamos fazer aquilo que sabemos fazer e garantir que as pessoas tenham o melhor momento! A vibe vai girar em torno do antigo e do novo. Portanto, vão poder ouvir os clássicos, músicas mais recentes e claro, uma ou duas músicas do novo álbum, Avrakedabra!

 


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