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Publicado a: 14/04/2016

Jimmy P: “O que me trouxe aqui foi ser apaixonado pelo rap”

Publicado a: 14/04/2016

[TEXTO] Bruno Martins [FOTO] André Gouveia

O rapper do Porto Jimmy P editou, no início do mês, o seu terceiro álbum. Essência marca o cumprir de um objectivo a que Joel Plácido se tinha proposto: fazer três álbuns em três anos. Com um sorriso nos lábios, confessa-nos que o objectivo não foi completamente atingido, uma vez que se atrasou seis meses na edição deste terceiro – contingências de uma carreira que conheceu tantas alterações desde 2013. Até há três anos, Jimmy P só tinha editado faixas soltas e feito colaborações (com Chullage, Bezegol ou no tema “Melhores Anos” com Valete) e participado em algumas colectâneas (Rascunhos, produzida por Conductor dos Buraka Som Sistema).

Antes de ser Jimmy P, Joel Plácido foi Supremo G. Mas foi com o disco #1 que “Jims” se apresentou ao público português, que o recebeu, num universo mais próximo da pop, de braços abertos. Joel ganhou o seu espaço, cresceu nos palcos e tornou-se presença assídua em festivais, ainda mais com a edição do segundo disco FVMILY F1RST.

Já no final do ano, Jimmy P surgiu com força em From Scratch, álbum de DJ Ride carregado de convidados. Um tema fortíssimo de egotrip, “Coisa Leve”, registado de forma imediata e simples naqueles cruzamentos de datas nas tournées dos dois artistas. E percebemos que Jimmy P também sabe ser heavy. Essência, este terceiro disco que já está à venda, traz de volta Joel Plácido até às suas origens: fechou-se em estúdio com o produtor J Cool, deixou de lado as fusões e entregou-se ao registo de MC a cuspir barras, com influência das suas raízes em Paris, onde cresceu como adolescente a ouvir hip hop antes de voltar para Portugal. Em conversa com o Rimas e Batidas, Jimmy P explica então que Essência é esta que lhe corre nas veias.


Tinhas o objectivo de fazer três discos em três anos. Não cumpriste o teu plano de lançamentos por uma unha negra.

Pois, não consegui cumprir na íntegra porque, desde o primeiro, passaram três anos e seis meses (sorri). Mas tinha essa ideia de fazer um disco todos os anos. Essência é o álbum que fecha esse ciclo.

E porque é que tinhas esse objectivo? Querias comprometer-te com a produção e com a escrita?

A ideia inicial, por alturas do #1 até era fazer uma trilogia. Mas o tempo foi passando e essa ideia foi deixando de fazer sentido. O que não quis deixar de fazer foi cumprir esse objectivo dos três discos, ainda que sem haver uma lógica de continuidade. Percebi que iam ser produzidos, cada um deles, de formas diferentes. O primeiro disco foi uma espécie de apanhado de temas que foram surgindo. O segundo contou com a colaboração de vários produtores, o que lhe deu uma estética muito heterogénea. Em Essência tenho um único produtor a fazer-me o disco todo, o J-Cool. E juntos tivemos a preocupação de construir bases instrumentais para me sentir à vontade e conseguir escrever bons textos, bons raps e fazer bons refrões. Por haver um propósito na génese do disco, acabou por ter uma estética mais coerente, até porque havia um propósito.

É também daí que vem o título Essência?

Criativamente, este é o momento em que consigo fazer o que sei fazer melhor. Sinto-me suficientemente confiante para executar essas coisas, a começar com esses refrões, com harmonias, mais melódicos – os raps também são mais melódicos – e levei algum tempo até me sentir à vontade para fazer isso.

É um disco mais coeso e que remete para aquilo que te levou a querer fazer rap no início da carreira?

Sem dúvida. O que me trouxe aqui, em primeiro lugar, foi o facto de ser apaixonado pelo rap, mas também pelo R‘n’B – embora não me sentisse tão à vontade a praticar este segundo estilo. Mas sempre tentei fazer isso, com mais ou menos dificuldades. As referências que eu tenho são as de artistas que cruzam esses dois estilos. E este álbum é um ponto de convergência entre esses dois estilos.



Esse momento de maior confiança também tem reflexo naquilo que escreves e na forma como interpretas os temas?

O universo cultural do hip hop é extremamente competitivo. O rap, como forma de expressão artística, também o é: incide muito sobre o ego, sobre aquilo que eu consigo fazer e tu não consegues. A verdade é que num país como Portugal, em que não há uma cultura de black music perfeitamente assimilada, muitas pessoas não associam o soul e o R’n’B como elementos pertencentes a esse universo cultural. Eu sempre os quis praticar… mas se fazes rap e és um artista melódico, já tens alguma dificuldade em ser aceite pelas pessoas que têm uma opinião mais purista.

Pelos hip hop heads?

Não queria chegar aí, mas… (risos). Este tempo todo estive a tentar impor-me e mostrar o meu trabalho a essas pessoas. Agora cheguei ao ponto em que apenas quero fazer a música que goste de ouvir para quando estou no carro, em casa, ou no chuveiro… Orgulho-me deste disco porque consigo ouvi-lo do início ao fim. Nos outros dois discos há músicas que não consigo ouvir mais, porque são canções em que sinto que fui quase obrigado a dizer: “Eu faço rap e preciso que vocês oiçam isto, mas porque eu também faço rap”. Agora já não tenho essa preocupação: apenas preocupo-me em fazer a música que gosto de ouvir.


JimmyP 2

“Se fazes rap e és um artista melódico, já tens alguma dificuldade em ser aceite pelas pessoas que têm uma opinião mais purista”


Em três anos conseguiste criar uma grande fan base. Há três anos nem sequer tinhas um disco…

Sim, tinha músicas na Internet. Mas estou numa fase da minha vida, pessoal e profissional, em que não estava há três anos. O que conseguimos fazer como equipa foi um bom trabalho. Os palcos em que pudemos tocar e os prémios que ganhámos são indicadores de que estamos a fazer um bom trabalho. Esta forma de fazer música, que não é assim tão convencional para aquilo que se faz cá, também me permitiu chegar a mais pessoas. Acho que o rap que eu faço é, na sua grande maioria, agradável. Não quero dizer ligeiro porque é uma palavra feia associada a este contexto.

Mas é um rap com melodias associadas.

Exactamente. Há essa preocupação e isso permitiu-me chegar a pessoas às quais não chegava há três anos, porque não sabia fazer isso bem. Tentava, e consegui fazer algumas coisas bem, mas não como faço agora.

Queres falar-nos também das colaborações? Costumam ser uma marca nos teus discos.

Estas colaborações são um pouco mais improváveis, até porque não conhecia pessoalmente nenhum dos artistas. Conheci a Fábia Maia pela Internet e quando vi os covers dela no YouTube e quis logo gravar com ela. O Terra Preta também não conheço ainda pessoalmente – mas gostava de conhecer para fazermos mais algumas coisas juntos. O Dji Tafinha é de Angola e contactei via Facebook. O Diogo Piçarra também só conheci quando fomos gravar juntos, mas antes disso também nunca tinha estado com ele.

E as colaborações acontecem porque os temas te sugeriam outras formas de interpretar?

Sim. Enquanto estávamos a desenhar o álbum, consegui imaginar determinados convidados para certos temas. Por exemplo, depois de gravar toda a faixa “Entre as Estrelas” é que percebi que precisava de uma voz como a do Diogo Piçarra.

Essa faixa, “Entre as Estrelas” é uma das canções mais emotivas do disco.

Sim, muito especial.

É sobre alguém em especial ou é uma canção pensada para que todos se possam identificar? Todos nós já perdemos alguém.

É dedicada a uma pessoa que perdi pouco tempo antes de gravar a música. Foi uma coisa vivida de forma tão intensa, em que fomos todos apanhados de surpresa, por isso senti necessidade de fazer um tema e prestar homenagem a essa pessoa. Ela era como se fosse a minha madrinha: contraiu uma doença há muitos anos, mas ninguém sabia que ela estava doente. Eu casei-me em Setembro e ela esteve no meu casamento, a dançar connosco! Pouco depois é que médicos telefonaram-nos de Londres a dizer qual o estado de saúde dela. Só apanhámos aqueles dois ou três dias de vida dela que lhe restavam, porque ela escondeu-nos tudo para nos poupar do sofrimento. Não tive oportunidade de me despedir dela, propriamente, por isso também não tinha outra maneira se não dedicar-lhe esta música.


“Acho que o rap que eu faço é, na sua grande maioria, agradável. Não quero dizer ligeiro porque é uma palavra feia associada a este contexto”


Vamos voltar ao disco. Sentes que existe mais coesão neste Essência por teres trabalhado só com um produtor, o J Cool. Porquê ele?

Eu trabalho com ele desde o meu primeiro álbum. Ele tem 22 anos e está comigo desde o início da carreira dele. Fomos solidificando esta parceria e fui percebendo que ele é quem melhor percebe a minha linguagem musical. E, a bem dizer, foi ele com quem desenvolvi o som que me é característico. Todas as músicas que tiveram mais alcance, importância e relevo, contam com a produção dele. Por isso fazia todo o sentido que fosse ele a fazer a produção de Essência. Ele vive em Londres e por isso também tem outra bagagem, outros estímulos musicais que absorve lá. Fechámo-nos em estúdio durante um mês e tal e produzimos tudo na hora. Só há um beat que não é dele, mas a produção executiva é toda do J-Cool.

Como é que se vai traduzir este Essência ao vivo? Os concertos vão servir como um apanhado destes últimos anos e dos três discos?

Não. Tive três ou quatro anos a tocar, mais ou menos, o mesmo espectáculo. Para este disco estamos a mudar tudo: desde a formação da banda até à linguagem musical. Temos muito menos elementos acústicos e mais digitais, para tornar o live muito fiel ao disco. Temos muita maquinaria, bateria digital em vez de acústica.

Vão ser concertos mais virados para o hip hop tradicional?

Diria que serão mais para linguagem da música digital. Por exemplo, o guitarrista tem duas pedaleiras onde controla um monte de efeitos e faz coisas que nem parece que faz sons de guitarra; o teclista com teclista com três teclados todos quitados, MIDIS e tudo mais… e o baterista tem a tal bateria digital – a SPD-SX – e um sampler para fazer uns loops. É completamente diferente do live, que era mais acústico.


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