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Publicado a: 16/12/2015

Dr. Dre: O doutor dos beats

Publicado a: 16/12/2015

[TEXTO] Rui Miguel Abreu [FOTO] Direitos Reservados

 

Em Straight Outta Compton há uma cena em que Dr. Dre conduz o seu Ferrari branco pelas avenidas de Los Angeles enquanto a polícia o persegue a alta velocidade. O que o filme não mostra é que essa perseguição, que ocorreu em 1995, teve como consequência directa uma pena de prisão de 5 meses, um episódio marcante que o próprio Dre descreve nas páginas da Rolling Stone como “a melhor coisa” que lhe aconteceu. Esse período de encarceramento permitiu ao produtor avaliar tudo o que de errado acontecia então na sua vida – começou a beber com intensidade após a morte do seu irmão Tyree e, logo depois do seu abandono dos N.W.A., envolveu-se com Suge Knight na fundação da polémica Death Row Records de artistas como Snoop Dogg ou Tupac Shakur. Dre saiu da prisão um homem novo e disposto a mudar. E a verdade é que mudou: “Quando saí da prisão larguei tudo”, recordou Dre. “saí da Death Row, casei, reavaliei tudo. E o plano que tracei na prisão, coloquei tudo isso em marcha”.

E o que é que Dre deixou para trás? Com os N.W.A. tinha abalado o mundo, com Snoop Dogg tinha colocado Doggystyle no topo da tabela da Billboard, proeza que repetiu com Tupac e o clássico “California Love”. Dre inventou um som: hip hop servido por linhas muito óbvias de sintetizador, derivadas das lições aprendidas a ouvir George Clinton e toda a discografia P-Funk. E armado com esses argumentos, Dre decidiu, muito simplesmente, reinventar o futuro. E o futuro, em 1996, chamava-se Aftermath.

 


 

https://www.youtube.com/watch?v=FWOsbGP5Ox4

 


Este novo projecto editorial colocou Dr. Dre em contacto com duas pessoas muito importantes na sua carreira: o executivo Jimmy Iovine, na altura ligado à Interscope, a editora com que a Aftermath tinha um contrato de distribuição, e Eminem. À época, havia uma autêntica guerra nada silenciosa entre a Costa Oeste e a Costa Este e Dre procurou distanciar-se, até porque colocar-se acima dessas disputas significava colocar-se acima da Death Row a que tinha estado ligado. Por isso mesmo, encontrar um talento tão “deslocado” como Eminem, que vinha de Detroit, foi o melhor que poderia ter acontecido a Dre que, ao mesmo tempo, necessitava de um grande sucesso para fazer a Aftermath descolar. “My Name Is” conseguiu tudo isso para Dr. Dre: recolocou-o no topo das tabelas, com um rapper branco do Michigan, ainda por cima, e deu-lhe o balanço necessário para se atirar a 2001, o álbum do clássico “Still D.R.E.”, editado em 1999 que registou vendas acumuladas de perto de 8 milhões de cópias. A fasquia ficou tão alta para Dr. Dre que Detox, álbum que esteve originalmente programado para 2004, nunca chegou a sair. Mas depois de algum tempo passado no set de filmagens de Straight Outta Compton, Dre recuperou o entusiasmo criativo e apoiado, como sempre fez, em talento mais jovem, nomeadamente em Kendrick Lamar, conseguiu fazer de Compton: A Soundtrack, o álbum que editou há apenas algumas semanas, um regresso – ele chama-lhe uma despedida – absolutamente fulgurante.

 


 

 


Andre Romelle Young completou 50 anos em Fevereiro último. O filme Straight Outta Compton é importante a vários níveis e um deles certamente é por lançar luz numa vida tão misteriosa como a de Dr. Dre: um tipo que sempre preferiu viver nos bastidores e puxar cordelinhos do que ocupar o centro do palco; um tipo que em Dezembro de 2000 declarava o seu ódio ao Napster nas páginas do NME e que hoje é figura-chave na Apple Music depois de ter vendido a empresa Beats, que criou com Jimmy Iovine ao gigante gerido por Tim Cook; um tipo que nunca escondeu que cantava rimas escritas por outros punhos que não o seu, mas a que ninguém regateia autenticidade. A universidade hip hop formou muitos doutores, mas nenhum do calibre de Dr. Dre.

 

*Artigo originalmente publicado na edição #112 da revista Blitz.

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