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Publicado a: 08/06/2017

Allen Iverson: a melhor coisa que aconteceu ao hip hop?

Publicado a: 08/06/2017

[TEXTO] Diogo Santos [FOTO] Direitos Reservados

Claro que sim. Allen Iverson foi uma das figuras mais caricatas e revolucionárias no universo onde a cultura desportivo-mediática, no caso a NBA, e a cultura da rua, no caso o hip hop, se cruzam. Apareceu em pleno apogeu de Michael Jordan e na fase de grande expansão mediática da liga profissional de basquetebol dos Estados Unidos da América. Nesta fase, na última metade da década de 90, os jogos já passavam em directo em vários países. Mais baixo do que a maioria, de calças largas, correntes ao pescoço, tranças no cabelo e com um caminhar desajeitado, Iverson levou a rua para dentro das quadras de basquetebol. E do rectângulo de 28×15 para as televisões, jornais e revistas (as redes sociais eram os bancos das escolas, as quadras, os salões de jogos) é só um crossover.

 



Fã de Snoop, N.W.A., Nas, Big, Tupac, Jadakiss e Redman, Allen Iverson bateu de frente com as normas de uma organização cada vez maior e mais lucrativa. De uma máquina que nos anos 80 – e antes, mas com menos mediatismo – não teve pejo em se afirmar contra o racismo. E de uma organização que em 2005, contra Iverson e outros jovens que encontravam a esperança nas tabelas, resolveu impor um código de vestimenta que atacara claramente as roupas associadas com a cultura do hip-hop: t-shirts e calças largas, bonés, do-rag, joalharia de grandes dimensões…

Iverson quis ser a resposta (The Answer, uma das alcunhas do histórico dos Philadelphia 76’ers). Rejeitou por completo as amarras impostas pela Liga. Não mudou a forma de estar, nem de vestir. Foi o rosto da revolta e pioneiro a expressar a cultura do hip hop nos corredores da NBA. “Lá por colocares um fato, não quer dizer que sejas boa pessoa. Este código não me permite ser quem eu sou”, disse na altura. Para os patrões, a restrição serviria para trazer ordem a uma Liga que estava a viver momentos conturbados. Para jogadores e adeptos, a regra era só mais um resquício de racismo e preconceito direccionado para os jovens negros, fãs de hip hop e do jogo.

 



Ao vestir a pele de guerrilheiro – mantendo os fãs do seu lado – Iverson foi andando de conflito em conflito. Ora com dirigentes, ora com treinadores, ora com árbitros. Acabou vencido pelo cansaço. É, para a vida que vagueia pelo basquetebol, a rua e o hip-hop, a figura mais carismática. Numa cultura de egos e de personagens carregadas de significado, Iverson é das mais impactantes dos últimos 20 anos. Representou o bairro, sobretudo o dos miúdos que se juntavam a atirar umas bolas e a ouvir provavelmente o The Grind Date, o The Tipping Point, o Madvillainy, o Kiss of Dead, o The New Danger ou o To the 5 Boroughs.

Passaram 12 anos. E a NBA que tentara abafar o hip hop, agora, abraça-o. Drake está em todos os pavilhões. Pharrell é mestre de cerimónias em várias ocasiões. Jay-Z tem uma empresa que agencia jogadores. LeBron James convence, ao que consta, Kendrick Lamar a lançar uma compilação e tem acesso às faixas antes destas saltarem para os ouvidos dos comuns mortais. Snoop Dogg, Ice Cube e Lil Wayne são muitas vezes convidados a opinar sobre o jogo.

“Tenho orgulho em ter começado este movimento. O desporto também serve para estas coisas. Somos todos iguais. Acho que sofri um bocado por querer ser eu. Mas a forma como me vestia e como hoje me visto… Olhem à vossa volta. Agora, todos têm tatuagens. Havia preconceito. Suspeitavam sempre de alguém com tranças. E hoje já temos polícias com tatuagens e com tranças. Eu sei que sofri por ter esta atitude, mas estou orgulhoso por saber que mudei a cultura e o jogo” – Iverson, quando colocava o ponto final na carreira, em 2013.

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